segunda-feira, 28 de junho de 2010

SUA

OLHEIRO –
Eu sou Rap-sodo
percorro o mundo e o submundo cotando histórias e fabulas assim como Esopo. Um olheiro aqui presente. Onipresente, onisciente. Quem eu sou? Um Deus-locutor.
Praça. Pracinha. O ponto. Local de encontro, de socialização
Iago passa. Isaías passa. Espaço de capitalização.
Eles estão sentados num baquinho de madeira debatendo a continuidade e os planos da carreira
O chão é de terra vermelha. Á matos. MATOS. Uma árvore e atrás alguns barracos. Final da tarde
(Iago) A fita é alta
(Isaías) Ariscado de mais
(Iago) Se a gente não fizer este assalto pra levantar esta grana o meu irmão morre.
(Isaías) O seu irmão...
(Iago) Ele é viado, mas minha mãe ta mau. É ele quem cuida da casa. Cada um na sua.
O diferente incomoda e provoca a pensar em reprimir. Homogeneidade abalada enfraquece o todo. Quem se desloca é tipo como louco, traidor, desertor. Pessoalidade. Você com você. Iago e Isaías, assim como muitos por aqui, eram todos UM.
É nóis. É nóis. Tamu junto!
Herança africana de andar em bando igual tribais. Jaz. O tempo passou, o mundo girou e o negócio chegou. O NEGÓCIO. Quem era amigo e parceiro, hoje é sócio.
(Isaias) Eu vou parar com isso. Quero ir pra igreja com a minha mãe. Arrumar uma mulher e construir a minha família. To fora dessa.
(Iago) Eu não vou tentar ser certo porque nem se eu trabalhar uns dez anos não vou conseguir juntar tanta grana. Eu vou sozinho. É. Cada um na sua.
Isaías se levanta e vai embora. Sai de cena.
Iago permanece no lugar. Pensa na grana que via ganhar. Na carreira de cocaína que vai ter que cheirar. No seu amigo de infância que desfez a aliança em nome da sua vida. Pensa no seu caixão com sua mãe em volta chorando. Acende um cigarro. Olha para os lados. Não há ninguém além dele na praça. Olha para o relógio. O sol se põe. Essa é a hora.
FIM
Por: Emerson Alcalde

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Roma, a quebrada fechada.

Local: Barraco 1 - Casa da namorada do ativista.
Personagens: Ativista, Namorada e depois Bandida
(Barulhos de helicópteros. Após o casal terem transado. Liga a televisão matéria do Feriado Decretado pelo poder paralelo)
ATIVISTA – Como que eu vou descer?
NAMORADA – Você vai ficar aqui! A favela ta em guerra.
ATIVISTA – Eu vou ter que ir mesmo assim. Me compromete de levar os alunos na universidade. É importante pra eles.
NAMORADA – Fica comigo. Estamos sozinhos. Um dia que você faltar não vai fazer diferença. Liga lá e avisa.
ATIVISTA – Não posso. Eu que agendei ônibus.
NAMORADA – Eles não vão deixar vocês saírem.
ATIVISTA – A gente vai se encontrar na ONG. Lá embaixo ta tranqüilo. Ninguém é bandido, não temos arma, nem drogas, o que eles podem fazer? E o meu direito de ir e vir?
NAMORADA – Que direito! Você sabe que não funciona.
(Entra a Bandida está armada com fuzil)
BANDIDA (chama a irmã de canto e fala baixinho) Você tem um absolvente pra me emprestar?
NAMORADA – Em cima da pia do banheiro tem um, pode pegar.
(Bandida se dirige até o banheiro)
ATIVISTA (arrumando sua mochila) Onde está aquele livro do Malcon X?
NAMORADA – (apontando para o banheiro) Ela pediu dá olhar, não sei onde pôs.
ATIVISTA – Depois você me dá.
NAMORADA – Relaxa.Senta aí. Você quer um café?
BANDIDA (voltando) – Tá tudo bem?
NAMORDA – Tudo bem. Fique esperta. Deu até na televisão.
BANDIDA – A repercussão foi maior do que esperávamos. Agora é guerra! Estamos mais armados do que os vermes. Se subir vai cair. A favela ta fechada ninguém entre e ninguém sai.
(Namorada olha de lado para o Ativista)
ATIVISTA – E aquele espaço que te falei pra construir a biblioteca comunitária?
BANDIDA – Depois a gente fala sobre isso. (sai)
ATIVISTA – Tchau!
NAMORADA – Deixa de ser teimoso. Vem cá me dá um beijo (beijam-se. A cena se fecha)

por: EMERSON ALCALDE